Opinião Outras Artes

Sobre celebrar os amigos quando mais sentimos falta deles

Tenho amigos de infância com quem falo todos os dias e outros com quem não converso há décadas. Ainda assim continuo a chamá-los de amigos, que isto das boas memórias teima em resistir à distância do tempo. Basta ouvirmos um “Há quanto tempo!” que de imediato abreviamos os anos que passaram e fazemos uma viagem aos dias em que tínhamos a vida inteira pela frente. 

Gosto de pensar que as amizades de infância são imunes ao tempo por serem suportadas numa ideia de longevidade, de um “para sempre” e “venha o que vier”. Enquanto crianças desconhecemos o significado do amanhã, tudo é aqui e agora, não nos preocupamos com o que passou e muito menos com que que está para vir. Talvez seja por essa razão que muitos de nós se tenham permitido ensaiar pela primeira vez sentimentos e emoções até então desconhecidas. Como uma espécie de primeiro acto da vida adulta, para onde vamos sem rede e nos deixamos improvisar. Livres.

As primeiras amizades são determinantes para desenhar os contornos da nossa autonomia e independência, no caminho da emancipação da nossa família. Com os amigos testamos os nossos limites e aprendemos a resolver conflitos que não surgem em casa porque nos relacionamos de forma diferentes. Com os amigos crescemos entre iguais.

Tenho muito a agradecer aos amigos que fiz na infância. Com eles aprendi muito e em parte projectei aquilo que hoje sou. Foi com eles que comecei a criar este sentido de comunidade que tanto valorizo. A ideia de que pertencemos a algo maior que nós e que hoje me faz ter a certeza que nunca estarei sozinha.

E a melhor parte de rever velhos amigos? Reencontrarmo-nos com os ecos da criança que fomos e descobrir que estes continuam a habitar em nós. 

Autor

Sonha em construir uma casa no Trisio. Acredita que sonhar não custa e por isso gosta de ter os pés um pouco levantados do chão.