Uma qualquer ponderação sobre o tempo atual do mundo virá, certamente, obscurecida de inquietações e embrulhada numa efervescência de notícias de guerra e crise nas democracias. Vivemos tempos complicados de instabilidade na paz, nas ideias, nos princípios e nos valores.
Estamos em guerra entre nações e entre pessoas.
A guerra como a descreveu o talentoso Pe. António Vieira: “ … é aquele monstro que se sustenta das fazendas, do sangue, das vidas, e, quanto mais come e consome, tanto menos se farta. É a guerra aquela tempestade terrestre que leva os campos, as casas, as vilas, os castelos, as cidades, e talvez em um momento sorve os reinos e monarquias inteiras. É a guerra aquela calamidade composta de todas as calamidades em que não há mal nenhum que ou se não padeça, ou se não tema, nem bem que seja próprio e seguro: – o pai não tem seguro o filho; o rico não tem segura a fazenda; o pobre não tem seguro o seu suor; o nobre não tem segura a honra; o eclesiástico não tem segura a imunidade; o religioso não tem segura a sua cela; e até Deus, nos templos e nos sacrários, não está seguro.” Assim meditava Vieira há 400 anos atrás.
Que diria agora com o novel armamento e os engenhos de destruição maciça?
Certo é que, hodiernamente, a crueldade entra-nos pelos olhos dentro através da TV.
Outrossim, estamos em conflito nas ideias, nos princípios e nos valores universais.
Há gente que não compreende este singelo desiderato “em democracia ganha-se por um voto e perde-se por um voto”. Só não aceita esta verdade fundamental quem detesta a democracia porque deseja criar tirania. Com todos as imperfeições, e virtudes, não conheço outro regime que legitime a vontade soberana de um povo no seu todo. Ao ouvi-los, aqui e acolá, cantar hossanas, sermões com o Criador (Deus), Pátria e Família, cânones de tudo estar mal, tudo ser falacioso! Ah! mas eles são a quinta essência, a verdade material e a absoluta! Se um dia eles ganharem aí sim, terão poder e governo ad perpetuam, serão os Príncipes Maquiavélicos!
Nestes novos tempos devemos, mais que nunca, ser resineiros. Portadores de uma mensagem de serenidade onde diálogo e um forte querer comum, não sendo tudo, são, no entanto, ferramentas fortíssimas de que dispomos no nosso dia-a-dia e com as quais poderemos melhor enfrentar o amanhã.
Importa, pois, construir pontes de diálogo, transparência e exigência. Não te cales perante as adversidades, as injustiças e os profetas da desgraça, aplica a raspadeira do resineiro de cabo longo, raspa e retira, no final da campanha a resina seca e estéril que ficou agarrada aos golpes (feridas) destes videntes. Eles não entrarão e não passarão para a lata da colha!
Andava a cogitar este tema, no meu passeio matinal no dia de Todos-os-Santos, pelas margens da Ribeira Grande com umas cores únicas de outono, quando dei de frente com a Ponte da Torna. Está perdido na distância do tempo o nome do primeiro oleirense que teve o talento e a arte de edificar uma ponte que ligasse as duas margens. Sabemos que em 1881, citando PIMENTEL, “a ribeira tem uma única ponte de madeira com três vãos, em sitio aprazível, a qual bem merecia ser de pedra”. Talvez o perfil da sua construção, muito próximo do modelo romano, tenha induzido erradamente alguns dos nossos patrícios a defender que a mesma seja da época romana. Debalde, o nosso “Bispo das Memórias”, perfeitamente objetivo, sentenceia: “obra nenhuma pública por conta do Estado se fez jamais no concelho de Oleiros, cujos habitantes, na sua quase totalidade, nem viram nunca um caminho de ferro, uma estrada macadamizada, nem ainda viável, uma diligência, uma ponte de pedra; um telégrafo elétrico, e iluminação a gás seriam para eles maravilhas incompreensíveis”.
Sei que a ponte nova da Carvalha, construída sobre a mesma ribeira na Sertã, com silhueta de pedra semelhante à da Torna, foi construída em 14 de agosto de 1900, pelo que não andarei muito longe da verdade afirmando que a “nossa ponte” com uma traça bonita e atraente anda muito perto desta data.
Na paz e sossego, cercado de mil cores, da margem da ribeira louvo os nossos antecedentes que do nada conseguiram construir as estradas, os caminhos, as fontes e as pontes.
Quão agradável foi descobrir naquela obra outras pontes que no porvir serão erguidas lá para os lados da Europa do Leste e do outro lado do Atlântico.