7 de outubro de 2023
Gregário por condição própria o ser humano não se limita, como os outros animais, a formar grupos somente para os fins primários de defesa e de busca de sustento. A família, próprio grupo básico por ele formado, tem já em si mesmo condições de formação de funcionamento, de permanência e continuidade que o diferencia e distingue dos outros grupos. O ser humano é fundamentalmente, e essencialmente, sociável. Só em sociedade, só formando grupos ou associações, consegue satisfazer a maior parte das suas necessidades uma vez que estas são variadas e complexas e percorrem os mais diversos campos: o social, o económico, o moral, o intelectual, o político, etc., etc., Nem um indivíduo, por si só, nem uma só família, isolada das outras, as conseguem saciar.
O homem e a mulher sempre lutaram pelo direito de se associarem. Mesmo para a constituição da família ainda hoje lutam pela liberdade de a constituírem segundo as suas convicções pessoais, livre de toda a imposição e de toda a coação legal.
O reconhecimento desse direito de liberdade de associação é uma das suas conquistas sociais recentes. Na sua Declaração sobre os Direitos do Homem, a Revolução Francesa reconheceu, implicitamente, o direito de associação, embora o não definisse claramente, uma vez que a associação aparecia, nesse tempo, destituída do conteúdo que a evolução social manipulou e concretizou através das sucessivas lutas que o homem e a mulher tem sustentado para a sua libertação económica, política e social. A essencialidade desse direito foi confirmada pela Assembleia Geral da ONU quando, na sua Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada na sessão de 10-12-1948, dispôs no n.° 1 do art.º 20.° que “todas as pessoas têm direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas”. E o art.º 11º da Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, datada de 4-4-1950, estabeleceu que “toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de associação.” A nossa Constituição da República consagra no seu art.º 46.º o direito à liberdade de associação.
Aos bombeiros aplica-se, um regime especial de tutela estadual, consagrado no art.º 6.º do Decreto Lei n.º 247/2007, de 27 de junho, que se distancia, com efeito, do regime comum decorrente da liberdade de associação. Esse regime resulta, aliás, de uma longa tradição: “É tradicional no nosso direito que estas pessoas coletivas [de utilidade pública], conquanto privadas, tenham um regime jurídico específico traçado pelo Direito Administrativo. Sempre se entendeu, na verdade, que sendo instituições que reúnem avultados patrimónios, normalmente por dádiva generosa de entes particulares ou públicos seja necessário fiscalizá-las para que não haja dissipação de bens, e para que as pessoas encarregadas de geri-las não administrem os patrimónios no seu interesse pessoal, mas no interesse geral que presidiu à afetação desses bens aos respectivos fins.” (Diogo Freitas dos Amaral, Curso de Direito Administrativo).
A esmagadora maioria das coletividades do concelho de Oleiros são Associações privadas de cultura, desporto e recreio. São instituições autónomas e independentes, pois não estão subordinadas a qualquer forma de poder político, religioso ou outro; tem funcionamento democrático, não tem qualquer fim lucrativo individual, a propriedade é social e prevalece o voluntariado. Os associados trabalham e contribuem de forma voluntária para assegurar o acesso das populações do concelho à cultura, ao desporto, ao recreio e ao lazer, para a promoção da educação, para o apoio social, para humanizar e duma forma genérica, promover uma melhoria de qualidade de vida e do bem-estar das populações.
Ao contrário destas, os BVO têm um regime especial fundado no interesse público, reconhecido no art.º 1. º dos próprios estatutos. Prossegue com a previsão, avaliação e prevenção de riscos coletivos, assumindo a proteção e o socorro de pessoas e bens, náufragos, acidentes graves ou catástrofes; tem por fim manter um Corpo de Bombeiros Voluntários ou misto, podendo desenvolver também, atividades de índole cultural e desportivo. (A Associação Humanitária dos BVO foi fundada estatutariamente em 7 de outubro de 1948, alterou os seus Estatutos em 11 de abril de 1995, e em 1 de outubro de 2013). É neste contexto que deve ser compreendida a especialidade do seu regime jurídico, contendo tanto privilégios como limitações especiais, bem como o direito ao apoio financeiro do Estado Central e das Autarquias Locais.
Configura, portanto, a sua missão um importante impulso de cidadania, marcando de forma expressiva a fronteira entre o carácter perene da solidariedade e do serviço público e a volatilidade dos valores efémeros da afirmação individual e egoísta que parecem triunfar na atual sociedade.
A projeção e o interesse público desta instituição que este ano completa 75 anos faz parte intrínseca da história contemporânea de Oleiros, com páginas de enorme brilho!
O trabalho de TODOS não é quantificável. Não há moeda que pague a defesa do património, as vidas humanas que foram salvas com a Vossa valentia, o Vosso altruísmo e o Vosso espírito de ajuda ao próximo.
Quero, aqui, homenagear a sua história, os seus associados, os membros dos seus órgãos sociais, o seu corpo de bombeiros, e as gerações que lhes deram e dão a alma e a vida.
Parabéns a TODOS!
[Visite a exposição “75 Anos ao Serviço da Comunidade”, com curadoria do fotógrafo Alberto Ladeira que retrata os 75 anos da Associação – Local: Galeria Municipal do Multiusos das Devesas Altas, em Oleiros, patente até ao dia 8 de outubro. Horário: terça a domingo, das 10 às 13h e das 14h às 18h.]
Post scriptum: No conceito de TODOS vai um especial agradecimento para o Tó-Zé Luís, ele sabe que não nos esquecemos dele. https://resina.pt/in-memoriam/