O ar do final de tarde naquela igreja de Goa Velha era quente, denso e húmido. Nem os mosquitos, nem o “ruído mediático” do zika (o mosquito e vírus famosos naquela altura) estragaram o momento. As evocações à herança portuguesa estavam por todo o lado, não tivesse sido aquele lugar a capital da Índia Portuguesa.
Finalmente, após mais de três semanas no frenesim do norte indiano, uma atmosfera de paz e familiaridade incomuns. Era um concerto de música sacra numa igreja de Goa Velha. Eu, a Catarina Duarte e o Tiago Soares – percussionista que nos acompanhou nos concertos que demos por lá – após um dia de visitas ao local histórico sentimo-nos transportados de forma surpreendente completa para a época áurea da presença portuguesa em Goa. Era uma envolvente incrivelmente épica e carregada de orgulho histórico, exploração marítima, conquista, grandeza, orgulho… mas sem o sangue, só o lado bom. Se é que é possível, mas é o que guardo.
Era, foi e será sempre incrível na minha memória.
Há uma ironia curiosa no meio disto. Passo a explicar. À minuta ocidental, o repertório em harmonia com o período histórico das edificações do local seria o Barroco… mas o que ouvimos foi o Stabat Mater de Jenkins, de 2008. Trata-se de uma reinvenção contemporânea de um hino do século XIII, mas pareceu-nos funcionar perfeitamente. Na humidade espessa de um final de dia em cheio, foi imersão completa.
Eis aquilo que ouvi ao vivo numa igreja de Goa, e que, por força das circunstâncias, me comoveu.