O homem acordava todos os dias sem despertador.
Ou eram os primeiros raios da manhã, que rasgavam a penumbra do quarto nas manhãs de verão, ou o som dos pingos de chuva na janela, nos invernos mais líquidos, sons aos quais o seu relógio biológico não era indiferente.
Nas manhãs de estio, vestia uns calções à pressa, descia a encosta verde, e em minutos tinha mergulhado nas águas límpidas de uma das ribeiras que escorriam pelos vales da vila.
À tarde tratava do gado, e das suas plantações, e trazia para o jantar o melhor que a natureza lhe proporcionava, ou um peixe acabado de pescar, com batatas e salada da sua horta, ou um enchido da sua produção caseira, que tinha como companhia um vinho biológico comprado ao seu vizinho. Nas feiras semanais vendia o excedente da sua produção, o que lhe permitia ter sempre dinheiro para fazer face a outras despesas, ou para beber um copo com os amigos, ou para comprar uma jaqueta no pronto a vestir.
Um dia falaram-lhe da cidade, onde as oportunidades de uma vida de sonho surgem como ratos em celeiro, do dinheiro que brotava como erva daninha em terreno lavrado.
O homem vendeu a sua casa térrea em frente ao campo verdejante que desaguava na ribeira onde se banhava nas manhãs de verão, e partiu decidido a lutar por uma vida melhor.
Comprou um carro que parava muito bem no trânsito, um escritório rodeado de janelas com vista para a microsoft, e um telemóvel que substituía os pingos da chuva, os raios de sol, o galo do vizinho, a conversa com o amigo, e as tardes com a vizinha solteira.
A vida correu tão bem pela cidade, chamaram-lhe homem de sucesso, exemplo de vida.
Vinte anos depois de uma labuta insana, conseguiu finalmente comprar uma casa com um pequeno jardim e uma piscina, onde se banhava tranquilamente, nas manhãs de verão dos seus quinze dias de férias anuais.